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STJ invalida prova digital por quebra da cadeia de custódia

  • Dr. Victor Meira
  • 23 de jul.
  • 2 min de leitura
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O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 738.418/SP, reafirmou um entendimento que se mostra cada vez mais relevante no processo penal contemporâneo: a validade das provas digitais está diretamente condicionada à observância rigorosa da cadeia de custódia.


Nos termos do artigo 158-A do Código de Processo Penal, a cadeia de custódia corresponde ao conjunto de procedimentos destinados a manter e documentar, de forma contínua e detalhada, o histórico do vestígio coletado. Esse controle se estende desde o reconhecimento inicial até o descarte da prova, registrando sua posse, manuseio e integridade ao longo de todas as etapas. A violação desses procedimentos configura a chamada quebra da cadeia de custódia, o que compromete a confiabilidade e a autenticidade do material probatório.  


No caso analisado, tratava-se de um policial civil condenado por corrupção passiva. A principal prova da acusação consistia em mensagens extraídas do aplicativo WhatsApp. A defesa, ao impetrar habeas corpus, alegou ausência de garantias técnicas quanto à integridade do conteúdo apresentado, argumentando que a coleta do material não seguiu os protocolos adequados de preservação.  


A Corte acolheu os argumentos defensivos, entendeu que a prova digital era imprestável e determinou seu desentranhamento dos autos. A decisão reforça que a cadeia de custódia não pode ser tratada como mera formalidade processual. Ainda que tenha sido positivada pela Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), o STJ reconheceu que sua observância já era exigível anteriormente, por representar desdobramento lógico do devido processo legal e da higidez da prova penal.  


Dentre as falhas identificadas, destaca-se a inexistência de apreensão formal do dispositivo, a ausência de espelhamento técnico (imagem bit a bit), a não utilização de algoritmos hash para validação de integridade e a completa falta de documentação quanto à coleta e preservação dos dados. Esses elementos inviabilizaram qualquer verificação posterior da autenticidade do conteúdo apresentado.  


O relator também ressaltou a importância de parâmetros técnicos reconhecidos internacionalmente, entre eles, destacam-se os conceitos de auditabilidade, repetibilidade, reprodutibilidade e justificabilidade. Tais critérios são indispensáveis para assegurar a chamada "mesmidade" da prova, ou seja, a identidade entre o conteúdo coletado e aquele que é levado ao conhecimento do juízo.


Dessa forma, o STJ fixou três importantes teses a respeito da admissibilidade das provas digitais no processo penal:

  1. A cadeia de custódia deve ser preservada para garantir a confiabilidade das provas digitais.

  2. A ausência de medidas para preservação da cadeia de custódia, quando impede a realização de testes de confiabilidade, torna a prova imprestável.

  3. A quebra da cadeia de custódia impõe o desentranhamento da prova dos autos.

Diante desse cenário, evidencia-se um novo paradigma para a atuação na seara penal: a defesa técnica precisa, cada vez mais, incorporar conhecimentos de ordem técnico-digital, compreendendo os fundamentos científicos e jurídicos que sustentam a admissibilidade das provas tecnológicas.


Não basta alegar que determinada prova existe. É imprescindível demonstrar, de maneira objetiva e tecnicamente embasada, que ela é íntegra, auditável e juridicamente confiável.

 
 
 

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